terça-feira, 13 de janeiro de 2009

O número pi

Um número fascinante PI, o valor da razão entre a circunferência de qualquer círculo e seu diâmetro, é a mais antiga constante matemática que se conhece. E' tambem um dos poucos objetos matematicos que, ao ser mencionado, produz reconhecimento e ate mesmo interesse em praticamente qualquer pessoa alfabetizada.Apesar da antiguidade do nosso conhecimento do PI, ele ainda é fonte de pesquisas em diversas áreas. Com efeito, dentre os objetos matemáticos estudados pelos antigos gregos, há mais de 2 000 anos, Pi é um dos poucos que ainda continua sendo pesquisado: suas propriedades continuam a ser investigadas e procura-se inventar novos e mais poderosos métodos para cálcular seu valor, sendo que a divulgação desses resultados constitui uma das raras ocasiôes em que vemos a Matemática atingindo os meios de comunicação de massa.
PI está em todos os lugares
O rolar das ondas numa praia, o trajeto aparente diário das estrelas no céu terrestre, o espalhamento de uma colônia de cogumelos, o movimento das engrenagens e rolamentos, a propagação dos campos eletromagnéticos e um sem número de fenômenos e objetos, do mundo natural e da Matemática, estão associados às idéias de simetria circular e esférica. Ora, o estudo e uso de círculos e esferas, de um modo quase que inexorável, acaba produzindo o PI. Daí a ubiquidade desse número. Ele é uma das constantes universais da Matemática.É importante chamarmos a atenção para o fato que também são frequentes as ocorrências do PI em estudos onde aparentemente, principalmente para uma pessoa de pouca formação matemática, não estariam envolvidas simetrias circulares: na normalização da distribuição normal de probabilidades, na distribuição assintótica dos números primos, na construção de números primos próximos a inteiros dados ( na chamada constante de Ramanujan ), e mil e uma outras situações.
A descoberta do PI Muitas pessoas acham que precisamos ter o valor do PI para calcular circunferência de círculos. Um exemplo clássico mostrando que isso NAO e' verdade e' o cálculo da circunferência da Terra por Erathostenes c. 250 AC. Ele mediu um arco de meridiano terrestre de 5000 estádios e, usando um instrumento de forma semi-esférica ( chamado skaphe ), verificou que esse arco de meridiano era proporcional a um arco de meridiano da skaphe, o qual media 1/50 do meridiano da esfera desse instrumento. Consequentemente, concluiu que o meridiano terrestre e' 50*5000 = 250000 estádios. Ou seja, em lugar nenhum precisou saber o valor do PI! Esse exemplo, e outros que poderiamos mencionar, mostram que é bastante surpreendente que a quase totalidade das pessoas ache que PI foi descoberto ao se relacionar circunferências com diâmetros dos respectivos círculos. Embora a definição usual do PI baseie-se na constância da razão circunferência : diâmetro, muito provavelmente não foi essa a origem do PI. Com efeito, é difícil imaginarmos situações práticas reais onde, numa civilização incipiente, alguém tenha precisado calcular a circunferência de um círculo de diâmetro conhecido, ou vice-versa. Muito mais naturais sao problemas requerendo achar a área de um campo circular em termos do diâmetro ou mesmo em termos da circunferência. Em verdade, devia-se até questionar se a descoberta do PI realmente ocorreu no contexto de círculos, e não no de esferas. Essa inquietação nao é só nossa. O famoso historiador matemático Abraham Seidenberg gastou muitos anos de sua vida vasculhando museus e lendo trabalhos de antropologia, em busca dos mais antigos indícios de envolvimento humano com círculos, esferas e o PI. O resultado desses estudos foi resumido nos seus artigos The ritual origin of the circle and square, Archiv. Hist. Exact Sc. 25, (1981), e principalmente em On the volume of a sphere, Archiv. Hist. Exact Sc. 39, (1988). Sua conclusão foi que o cálculo do volume da esfera em termos de seu diâmetro remontaria a antes de 2 000AC, sendo anterior a matemática das grandes antigas civilizações mesopotâmica, indiana, chinesa e egípcia. O historiador matemático B. van der Waerden identifica essa origem com o que chamo de Tradição Origem da Matemática e a localiza no Vale do Danúbio c. 4 000 AC. Segundo Seidenberg, nessa tradição também se teria reconhecido a igualdade da constante de proporcionalidade relacionando circunferência com diâmetro e área de círculo com quadrado do raio; ou seja, já nessa tradição, possivelmente lá por 3000 a 4000AC, se teria reconhecido que o "PI da circunferência" é igual ao "PI da área do círculo". Também é interessante observar que Seidenberg concluiu que a descoberta dessa igualdade usou métodos infinitesimais, ao estilo de Cavalieri. E' preciso que fique bem claro que o que o trabalho de Seidenberg achou na noite dos tempos, em bem remota antiguidade, foram apenas indícios indiretos de envolvimento com PI. Os mais antigos documentos concretos que temos e que tratam explícitamente de PI são tabletas mesopotâmicas de c. 2 000 AC, como a mostrada ao lado. Examinando a figura desenhada, fica fácil ver que a mesma corresponde a adotar a aproximação grosseira PI = 3, que é a mais comum das aproximações para PI que encontramos nos documentos mesopotâmicos.
EXERCÍCIO ( esse exercício pode ser feito com tampinhas de garrafas peti)
Para fazer a quadratura ( = achar um quadrado de mesma área ) de um círculo dado, os egípcios usavam a seguinte regra prática: construa o quadrado cujo lado é o segmento que resulta ao cortarmos fora a nona parte do diâmetro do círculo dado. Obviamente, essa regra faz uma quadratura aproximada e equivale a tomar PI = 4 ( 8 / 9 )2 = 3.16. Essa aproximação é muito difundida na literatura do ensino secundário e primário e tipicamente ela é citada ( erroneâmente ) como a mais antiga aproximação conhecida para o PI. Existem duas razões para a divulgação desse erro: o grosso da literatura histórica acessível aos professores do ensino primário e secundário é obsoleta, nem ao mesmo tomando conhecimento das pesquisas fundamentais de Neugebauer c. 1 930 sobre a matematica mesopotâmica; a outra razão é a perniciosa influência que as fantasias e deturpações da Etnomatemática tem tido no ensino elementar. Embora essa aproximação egípcia para o PI não seja a mais antiga e nem a mais exata entre as conhecidas na Antiguidade, ela corresponde a uma regra muito simples, prática e razoavelmente precisa. Mais importante e interessante é perguntar como os egípcios descobriram tal regra.Inúmeros historiadores investigaram essa questão e, talvez, quem mais detalhadamente a estudou foi Paulus Gerdes, no trabalho: Three alternate methods of obtaining the ancient Egyptian formula for the area of a circle, in Historia Math. 12 ( 1 985 ), n.3.Nesse trabalho, o Prof. Gerdes apresenta três tentativas de reconstrução do método de descoberta pelos egípcios, sendo que passaremos a explicar a mais plausível delas, a que envolve um procedimento comum entre os construtores egípcios: o método dos discos metálicos. Usando os discos metálicos, fica fácil ver como eles chegaram a tal valor observando as figuras abaixo:
Obviamente, o quadrado acima faz a quadratura ( aproximada ) do círculo, pois essas duas figuras são formadas de 64 discos. Para V. obter a aproximação egípcia do PI, resta V. conseguir explorar a igualdade dessas áreas levando em conta o valor do diâmetro do círculo e o do lado do quadrado expressos em termos do tamanho dos discos.
A descoberta teórica do PI
Quem pela primeira vez provou rigorosamente a existência do PI?Bem, essa pergunta talvez nunca possa ser respondida. Que eu saiba, a mais antiga referência que temos de uma demonstração da existência do PI fala de Hippokrates de Chios, c. 430 AC. Trata-se de uma nota de Simplicius, filósofo grego que viveu quase mil anos depois de Hippokrates. Simplicius, no seu Comentário sobre o livro Physis, de Aristóteles, menciona que Eudemos na sua História da Geometria ( escrita c. 330 AC e, hoje, há muitos séculos totalmente perdida ) diz que Hippokrates demonstrou que a razão entre as áreas de círculos é igual à razão entre os quadrados dos respectivos diâmetros. Por outro lado, o mais antigo documento ainda existente e que traz demonstração da existência do PI é o livro Elementos de Euclides, escrito em c. 300 AC. Na proposição 2 do Livro XII dos Elementos, Euclides enuncia e prova que círculos estão um para o outro assim como os quadrados de seus diâmetros, que é o resultado atribuído acima a Hippokrates. Ademais, na proposição 18 desse Livro XII, Euclides enuncia e prova que esferas estão uma para a outra assim como a razão tríplice de seus diâmetros. Euclides encerrou o Livro XII de seus Elementos sem tratar da questão da área da esfera. ( Coube a Archimedes c. 250 AC mostrar que a razão entre as áreas de esferas é igual à razão entre os quadrados de seus diâmetros ). Mas o mais curioso é que em nenhum dos treze livros dos Elementos Euclides fala no PI da circunferência.
Por que é tão difícil calcular o PI?
A principal razão é que PI não é uma fração. Com efeito, se PI pudesse ser escrito como uma fração m / n, seu cálculo poderia ou se resumir em buscar o valor de tais numeros inteiros m e n ou explorar a periodicidade de sua representação decimal( por exemplo, se fosse verdade que PI = 22 / 7 = 3.142857 142857 142857 ..., então nos bastaria achar o valor da parte inteira, 3, e o bloco 142857 que se repete indefinidamente ) O fato de que, por mais de 2000 anos, ninguém tivesse conseguido explorar nenhuma das duas possibilidades acima é exatamente o que sugeriu que PI não deva ser uma fração. A verificação rigorosa desse fato, ou seja a demonstração da irracionalidade de PI, veio só com Lambert, em 1 761.Em verdade, por si só, a irracionalidade de PI não seria suficiente para determinar a dificuldade de seu cálculo; com efeito, existem irracionais de representação decimal previsível, e então fáceis de calcular, como é o caso de 3.10110111011110... . PI é difícil de calcular porque é um irracional imprevisível: sua representação decimal não mostra nenhuma previsibilidade, sendo que acredita-se que seus algarismos se distribuam aleatoriamente. O cálculo de aproximações práticas do PI? Dada a ubiqüidade do PI, já comentada acima, é mais do que natural e importante que desejemos calcular seu valor. Contudo, dada sua irracionalidade imprevisível, jamais saberemos seu valor exato e isso nos leva a indagar: por que não nos contentarmos com aproximações PRATICAS do PI? Nas lides diárias, dificilmente precisaremos conhecer uma aproximação melhor do que 3.14, enquanto que a vasta maioria dos calculos científicos não precisa saber mais do que 3.1416 e somente cálculos matemáticos muito exigentes, como o da obtenção de valores muito exatos das funções trigonométricas, precisaria saber mais de 10 dígitos do PI.O mais antigo matemático que se preocupou com a obtenção de aproximações PRATICAS do PI foi Archimedes c. 200AC, em seu trabalho Sobre a medida do círculo. Usando o método dos polígonos, que descreveremos adiante, na proposição 3 desse trabalho ele mostra que: a circunferência de qualquer círculo é maior do que três vezes seu diâmetro, e o excesso e' menor do que a sétima parte do diâmetro mas maior do que dez vezes sua septuagésima primeira parteou seja: 3 10/71 <>
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